terça-feira, 24 de maio de 2016



temer direitos trabalhistas
Como adiantado em outro texto,
“Assim, não é nenhum absurdo ou mera força de expressão prever que eventual queda do presente governo venha acompanhada de um “comando” em torno da urgência da implementação de uma intensa reforma trabalhista, na qual a ampliação da terceirização pareceria peixe pequeno, até porque para ser levada adiante requereria o desmonte da Constituição de 1988, atingindo não apenas os direitos trabalhistas, mas também a Justiça do Trabalho, o que seria, sem dúvida, o sonho dourado de uma parcela da classe empresarial (que de brasileira pouco tem), sendo que a isso não se chegaria sem o aprofundamento da lógica do Estado de exceção, situação na qual todos seriam, de um jeito ou de outro, atingidos, inclusive pessoas da classe média que se acham integradas ao capital e que estão nas ruas alimentando esse monstro de sete cabeças.”[1]
E tão logo o “impeachment” deu seu passo mais incisivo, com o afastamento da Presidenta Dilma e a nomeação de Temer, a primeira providência tomada pelo governo temporário foi a de anunciar a reforma trabalhista[2].
A reforma em questão é apoiada em dois pilares: ampliação da terceirização e institucionalização do negociado sobre o legislado[3].
O argumento utilizado é o mesmo de sempre: modernização das relações de trabalho, já que a CLT seria velha, com mais de 70 (setenta) anos de idade; e necessidade de redução de custos da produção para alavancar a economia.
Mas nem a CLT é velha, nem a redução de custos da produção, por meio da diminuição de direitos trabalhistas, serve ao propósito de impulsionar a economia e tirar o país da crise.
Essas afirmações não decorrem de mera opinião e sim de uma constatação história.
Senão vejamos.
I- Os recorrentes ataques aos direitos trabalhistas
Na história brasileira são recorrentes os ataques à legislação trabalhista com base em fundamentos supostamente econômicos, fazendo com que não haja sequer alguma novidade na argumentação com a qual o governo temporário busca justificar a pretendida reforma trabalhista.
Destaque-se, a propósito, a fala de José Pinto Antunes, professor catedrático de Economia Política da Faculdade de Direito da USP, manifestada na aula de abertura do ano letivo de 1957, com o título: “O Robô e as conseqüências econômico jurídicas de sua utilização”[4].
O Direito do Trabalho, que entre nós ainda engatinhava e que era notabilizado pela característica peculiar de ser um direito abertamente desrespeitado, ou seja, que não produzia os resultados pretendidos na realidade prática, já tinha, segundo quis fazer acreditar Pinto Antunes, causado vários danos à economia, em razão de ter se estendido demais e dos custos que teria gerado:
“O Direito do Trabalho, de princípio de ordem, passou a fator de desequilíbrio, porque em contradição com as exigências irremovíveis das leis do preço que regem a produção. O direito legislado se contrapõe às necessidade econômicas. A crise da economia traz a crise do direito. A ordem econômica, abalada nos seus alicerces, ameaça levar na sua queda a própria ordem jurídica que condiciona.”
Na década de 60, quando o desmonte da legislação trabalhista foi iniciado com a eliminação da estabilidade em troca do FGTS, Octavio Bueno Mago, em artigo publicado na edição de maio/junho de 1966 da Revista LTr (“Revisão da estabilidade”, pp. 273-283), assim se pronunciou:
“A maioria das críticas feitas ao Projeto não se dirigem propriamente a ele resolvendo-se, ao contrário, numa apologia sentimental da estabilidade, ou na condenação de sua supressão, que nele absolutamente não se preconiza. Essa falta de objetividade atraiçoa, em muitos casos, o propósito de atingir, por razões políticas, os que o apadrinham e não o que nele se contém.
(….)
Num país com o Brasil, o grande objetivo a ser alcançado é o da maximização da taxa de desenvolvimento. Só o desenvolvimento econômico poderá propiciar efetiva melhoria das condições de vida da população.
Na perseguição de tal objetivo, há dois instrumentos fundamentais: apoupança e a produtividade.
(….)
No Projeto em análise estão presentes os referidos instrumentos de progresso: a poupança e a produtividade. (….) A conversão do Projeto em lei será, pois, um fator de desenvolvimento econômico e social, a ser por todos desejado.”
O mesmo autor, no início da década de 70, defendia a existência de “novas tendências do direito do trabalho”, que colocariam em questão o princípio protetor do Direito do Trabalho, justificando a redução de direitos.
O Editorial da Revista LTr, de abril de 1987, traz em destaque a discussão em torno da necessidade da adoção de métodos extrajudiciais para a solução de conflitos trabalhistas, fazendo menção expressa ao teor da palestra proferia pelo Ministro Marcelo Pimentel, Presidente do TST, proferida em Congresso jurídico, em março/87, no qual refere à necessidade de modernização do Direito do Trabalho:
“Em segundo plano, mas também de caráter urgente e inadiável, repousam as modificações estruturais, de conteúdo mais profundo e caráter perene, Aqui, cogita-se de transformações e melhorias que se iniciam por uma reelaboração do Direito do Trabalho modernizando o direito material consolidado, subtraindo-lhe o anacronismo…”[5]
A modernização preconizada pelo Ministro não era no sentido de uma redução de direitos para melhorar a competitividade das empresas frente aos desafios internacionais e sim com vistas a um Pacto Social, que partia da ideia central de uma melhor distribuição da renda produzida, exortando os capitalistas a abrirem mão de seus privilégios e os trabalhadores a um espírito de colaboração e responsabilidade.
De todo modo, a fissura aberta pela defesa da modernização, partindo do pressuposto de que a legislação era arcaica, dá margem ao avanço da ideia de desmonte do Direito do Trabalho e da própria Justiça do Trabalho. Em complemento ao edital referido, a Revista publica artigo de Edy de Campos Silveira, para o efeito de reforçar o tema da arbitragem: “Contribuição e elaboração de um anteprojeto de lei dispondo sobre ‘a arbitragem facultativa na solução dos conflitos individuais do trabalho’.”[6]
O texto de Cássio Mesquita Barros Jr., publicado em setembro de 1987, é a demonstração explícita da presença do neoliberalismo no meio jurídico trabalhista bem antes do período admitido enquanto tal pela historiografia.
Diz Mesquita:
“A flexibilização econômica e social parece ser a mais importante questão das economias européias atingidas pela crise internacional. No conjunto das formas institucionais e jurídicas, relativas às relações de trabalho, é o meio privilegiado de lutar contra os sistemas rígidos que engendram custos insuportáveis na competição internacional.”[7]
Em 1994, Luiz Carlos Amorim Robortella escrevia a obra, “O moderno Direito do Trabalho”, que, no fundo, preconizava o fim do Direito do Trabalho, no que foi acompanhado pelo conteúdo de diversos artigos escritos por Arion Sayão Romita, compilados em obra publicada em 2003, com o sugestivo título, “O princípio da proteção em xeque”.
E como preconizava, à época, um dos principais porta-vozes dessa corrente: “Convenhamos: a CLT e a Justiça do Trabalho têm mais de 50 anos. Elas foram criadas para um mundo fechado e para uma economia protegida contra as agressões do processo competitivo.”[8]
Em 1997, esse mesmo autor preconizava, inclusive, que o emprego ia acabar:
“Já há sinais disso. O mundo do futuro está nascendo completamente diferente do atual. Tudo indica que, daqui a uns dez anos, a grande maioria das pessoas trabalhará não mais em empregos fixos, mas como autônomos, em projetos que têm começo, meio e fim.[9]
E como ficarão as licenças, férias e aposentadoria? Já nas primeiras décadas do próximo milênio, isso vai virar peça de museu porque, no novo mundo do trabalho, desaparecerá a relação de subordinação entre empregadores e empregados. Isso ocorrendo, desaparecerá quem conceda licenças, férias e aposentadoria.”[10]
Na onda das previsões, e sem se importar muito com a coerência de se colocar em defesa de um modelo assumido, nas entrelinhas, como inviável para a sociedade, já que benéfico apenas para alguns poucos, apresentando um cenário apocalíptico[11], chegou mesmo ao ponto do grotesco:
“Para você que é jovem e gosta de estudar, está aí um “kit de sobrevivência” para enfrentar o desemprego estrutural. Ouça bem os sons do futuro. Eles já estão anunciando: trabalhadores do mundo, eduquem-se! Leis do mundo, flexibilizem-se.”[12]
Essas falas servem, ademais, à produção da compreensão de que não são os empregadores que estão errados ao praticarem o ato ilícito de descumprir os direitos trabalhistas, o erro estaria na lei ao lhe obrigarem a respeitar padrões mínimos de exploração do trabalho (e do trabalhador).
A ilegalidade, inclusive, é apontada com o eufemismo da “informalidade”, com relação à qual os capitalistas não têm nenhuma relação. Tratam a questão como um efeito “natural” da economia e da vontade dos próprios trabalhadores, como se estes existissem sem correlação com o capital. E chegam mesmo a dizer que os trabalhadores “estão” na informalidade em razão dos rigores da lei, apontando, sem o menor escrúpulo, que a saída para essa situação dos trabalhadores é que seus direitos sejam eliminados. Ou seja, ilegalidade é informalidade e a regularização da informalidade é a retirada de direitos para que sequer alguma visualização de irregularidade da conduta dos empregadores seja possível.
E vão além: dizem que a lei gera conflitos e que o fato de existirem muitas reclamações trabalhistas é a prova de que a lei está errada!
Vejam, a propósito, os argumentos expressos pelo economista Hélio Zylberstajn, que foram expressos em Congresso organizado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª. Região[13], realizado em Campinas, em 2013. Segundo sua visão, “em que pese a melhora verificada nas últimas duas décadas, quando o nível de empregos formais no Brasil subiu pelo menos 10 pontos percentuais, ao menos metade do mercado de trabalho brasileiro ainda é composta por trabalhadores que atuam na informalidade”.
E prossegue:
“Apesar da CLT, ainda existe muita informalidade no mercado de trabalho brasileiro, que se caracteriza pela alta rotatividade da mão de obra. Ainda hoje, no Brasil, um terço dos trabalhadores não completam um ano no emprego.
(….)
Além disso, a CLT induz o litígio, forma pouco eficiente de manifestação do conflito. Anualmente são ajuizadas na Justiça do Trabalho brasileira cerca de dois milhões de reclamações.”
Também desconhecendo a história e até desconsiderando a posição assumida pelos próprios industriais por ocasião do advento da legislação trabalhista no Brasil na década de 30, o economista sugere que a CLT teria imposto um sistema que impedia a negociação “entre patrões e empregados e muita intervenção por parte do Estado (que detém a exclusividade na produção de regras e na solução de controvérsias), com estruturas de representação (sindicatos) controladas e cooptadas”.
Conclui, defendendo a aprovação do ACE, sob o argumento, inclusive, de que, afinal, são os próprios trabalhadores que assim desejam:
“No modelo proposto pelo ACE, a negociação é direta entre as partes, no próprio local de trabalho. Com essa proposta, os metalúrgicos do ABC querem produzir regras, inovar, porém esses atalhos são vistos com desconfiança. Em alguns círculos, são combatidos explicitamente, inclusive.
(….)
Mas eles merecem uma oportunidade. Afinal, são voluntários, partem dos próprios trabalhadores e não vão revogar nada, nenhum direito.”
Em 2014, o Presidente de Federação Fecomercio SP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo), Abram Szajman, em artigo intitulado, A derrota do país na área trabalhista, publicado no jornal Folha de S. Paulo[14], consegue, em poucas palavras, deixar claro o sentimento empresarial sobre a legislação trabalhista, preconizando que o empresário deve cumprir a lei tributária, mas no que tange à lei trabalhista está livre para descumpri-la, criticando a tentativa do governo de tentar “penalizar todo e qualquer desvio das normas regulamentadoras, mesmo quando acertado livremente de comum acordo entre empregador e empregado”.
Passando em revista essas antigas manifestações, que hoje se apresentam como efeito da “modernidade”, é, no mínimo, curioso lembrar que o segmento industrial, que agora defende a liberdade na negociação coletiva como forma de impulsionar a economia, atacando a intervenção do Estado decorrente da legislação do trabalho, tenha, na década de 30, quando essa legislação estava em formação, se posicionado favoravelmente à lei e contrariamente à negociação coletiva.
No referido período, a FIESP chegou mesmo a reconhecer que a legislação consistiria “num cometimento útil e imprescindível ao atual estágio da civilização brasileira, que custa a crer já não fosse objeto de preocupação dos nossos estadistas”[15], destacando, inclusive, “o calor e o ingente esforço” implementado pelo Ministro do Trabalho para criar a legislação trabalhista, “cuja finalidade é dar amparo aos trabalhadores”[16], ainda que mantendo algumas divergências quanto ao alcance das medidas.
Essa postura, no entanto, era mais estratégica do que real. De plano, embora concordasse com a importância da legislação, o empresariado argumentava que não teria condições de arcar com os custos decorrentes de sua aplicação e, por isso, solicitava, expressamente, a prorrogação “tanto extensa quanto possível” de sua entrada em vigor.
A entrada em vigor se deu a partir de 1932, mas isso só foi possível em razão de acordo entre o governo e os industriais, que implicou na ineficácia concreta da legislação, conforme relata Werneck Vianna:
“Na verdade, as duas partes cederam. Os empresários, ao aceitar a legislação social, o governo pela tolerância que mostrou quanto às faltas cometidas por aqueles contra suas disposições. A boa vontade do Ministério do Trabalho em relação ao empresariado paulista foi a ponto de delegar sua atividade fiscal ao Departamento do Trabalho do Estado, órgão subordinado à Secretaria da Agricultura. Por esse mecanismo, as classes dominantes de São Paulo passaram a controlar a implementação das leis trabalhistas, o que diz bem da eficácia da nova fiscalização.”[17]
Os industriais interessavam-se, verdadeiramente, pela parte da legislação que mantinha os sindicatos sob forte controle. De fato, o regime corporativo encontrou solidariedade no seio industrial. Aceitam a legislação “sob a condição de que os sindicatos não invadam a arena social” e, assim, rejeitam o instituto da negociação coletiva, que segundo os empresários poderia submetê-los a serem explorados pela “classe operária organizada sindicalmente[18].
II- O mito da “velhice” da CLT
A CLT, aquela de 1943, como origem da legislação trabalhista e como reguladora das atuais relações de trabalho, não existe.
Com efeito, dos 625 artigos da CLT, que dizem respeito aos direitos materiais trabalhistas propriamente ditos, considerando as esferas individual e coletiva, apenas 278 não foram revogados expressamente por leis posteriores. Destes últimos, muitos, embora não tenham sido revogados expressamente, não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988 ou foram superados por regulação mais ampla conferida pela própria Constituição Federal ou por legislação posterior, como são os casos, por exemplo, dos artigos 232 e 233, dos músicos profissionais, seguindo as diretrizes traçadas pela Lei n. 3.857/60. Inserem-se na condição de não recepção os 17 artigos do Capítulo da Nacionalização do Trabalho e muitos dos dispositivos referentes à organização sindical, em especial, os referentes aos artigos 512, 515, 518, 519, 520, 522, 523, 527, 529, 531, 533, 535, 537, 539, 546, 547, 553, 554, 556, 558, 559, 564, 570, 571, 572, 573, 574, 578, além dos artigos 58, § 1º. do art. 59, 67, 68, 76, 78, 79, 81, 84, 86, 119, 373, 415, 416, 419, 422, 423, 487, 503 e 506 (total: 65 artigos).
Sobram, assim, 211 artigos. Destes, pouquíssimos conferem, de fato, direitos materiais aos empregados, com o efeito de gerarem custos à produção, e a maioria está ligada a profissões especiais. A respeito destes 211 artigos referidos, seguindo a ordem da CLT, tem-se que: os 09 primeiros são conceituais; 03 dizem respeito à anotação da CTPS; 02 cuidam de fichas de registro; 05, jornada de trabalho; 04, períodos de descanso; 01, quadro de horário; 01, penalidade administrativa pertinente ao Capítulo; 07, salário mínimo; 05, telefonia; 02, operadores cinematográficos; 10, ferroviários; 05, marinha mercante; 01, serviços frigoríficos; 08, trabalhos em minas de subsolo; 13, jornalistas profissionais; 05, professores; 25, químicos; 01, penalidade administrativa pertinente ao Capítulo; 16, proteção do trabalho da mulher; 01, penalidade administrativa do Capítulo; 14, proteção do trabalho do adolescente; 11, conceitual sobre as modalidades de contrato de trabalho; 06, remuneração; 02, alteração do contrato de trabalho; 05, suspensão do contrato de trabalho; 08, rescisão do contrato de trabalho; 04, aviso prévio; 08, estabilidade no emprego (incluindo a decenal, que a quase unanimidade considera não ter sido recepcionada pela Constituição); 04, cessação do contrato por força maior; 03, disposições especiais; 22, organização sindical e negociação coletiva (total: 211 artigos).
Esses dispositivos, como se vê, não se referem aos direitos trabalhistas propriamente ditos, numa perspectiva do custo do trabalhador em geral. Além disso, se bem examinada a CLT, muitos desses dispositivos foram parcialmente reformulados por leis posteriores, como é o caso, por exemplo, dos artigos 4º, 58, 59, 71, 74, 78, 322, 442, 443, 449, 459, 462, 464, 469, 472, 475, 478, 482, 483, 488 e 514 (23 artigos).
Restam, portanto, 188 artigos.
Mas é essencial perceber que esses 188 artigos da CLT (ligados aos direitos materiais), que não foram revogados ou alterados, dizem respeito a institutos jurídicos específicos, regulados, no conjunto, em Capítulos da CLT e estes Capítulos, ao longo do percurso histórico, tiveram vários de seus demais dispositivos (artigos) modificados, significando, por conseguinte, que aqueles que não receberam alteração foram acatados como pertinentes pela nova configuração jurídico-político-econômica.
Como se vê, é completamente sem sentido elaborar uma crítica à legislação trabalhista no Brasil a partir da “idade” da CLT, como se a CLT de 1943 não tivesse sofrido qualquer alteração até hoje e como se fosse uma obra concluída exclusivamente pelas mãos de Getúlio Vargas.
Vale reparar, ainda, que a maior parte dos direitos aplicáveis às relações de trabalho atualmente não possuem a CLT (o Decreto n. 5.452/43) como sua base material, vez que estão relacionados ou na Constituição de 1988 ou em dispositivos normativos editados após 1943.
Senão vejamos: Constituição Federal de 1988 (arts. 7º a 9º.); Emenda Constitucional n. 72/2013 (trabalho doméstico); Lei Complementar n. 7/70 – PIS; Lei n. 605/49 – Repouso semanal remunerado; Lei n. 3.207/57 – Vendedores, viajantes ou pracistas; Lei n. 4.090/62 – Gratificação de natal; Lei n. 4.923/65 – Jornada de trabalho; Lei n. 5.811/72 – Trabalho em atividade petrolífera; Lei n. 5.859/72 – Empregado doméstico; Lei n. 5.889/73 – Trabalho rural; Lei n. 6.019/74 – Trabalho temporário; Lei n. 6.321/76 – Alimentação do trabalhador; Lei n. 7.064/82 – Serviços no exterior; Lei n. 7.102/83 – Vigilantes; Lei n. 7.418/85 – Vale-transporte; Lei n. 7.644/87 – Mãe social; Lei n. 7.783/89 – Greve; Lei n. 7.853/89 – Deficientes Físicos; Lei n. 7.859/89 – PIS-PASEP; Lei n. 7.998/90 – Seguro-desemprego; Lei n. 8.036/90 – FGTS; Lei n. 8.069/90 – Criança e adolescente; Lei n. 8.213/91 – Previdência Social; Lei n. 8.542/92 – Salário; Lei n. 8.900/94 – Seguro-desemprego; Lei n. 9.029/ 95 – Admissão ao trabalho; Lei n. 9.279/96 – Propriedade industrial; Lei n. 9.424/96 – Salário-educacão; Lei n. 9.601/98 – Contrato por prazo determinado; Lei n. 9.608/98 – Serviço voluntário; Lei n. 9.615/98 – Atleta profissional; Lei n. 9.962/00 – Empregado público; Lei n.10.101/00 – Participação nos lucros; Lei n.10.192/01 – Salário; Lei n.10.741/03 – Idoso; Lei n.10.820/03 – Empréstimo consignado; Lei n.11.648/08 – Sindicato; Lei n.11.770/08 – Licença-maternidade; Lei n 11.788/08 – Estágio; Lei n.12.023/09 – Trabalho avulso; Lei n.12.288/10 – Igualdade racial; Lei n.12.382/11 – Salário mínimo; Lei n.12.506/11 – Aviso prévio proporcional; Lei n.12.619/12 – Motorista Profissional (alterado pela Lei n. 13.103, de 2 de março de 2015);  Lei n.12.690/12 – Cooperativas de trabalho; Lei n.12.761/12 – Vale cultura…
III- O percurso histórico da CLT
A história da legislação trabalhista, ademais, seguiu um curso diretamente ligado à política dos diversos governos que advieram após a saída de Vargas do poder, em 1945, valendo dar destaque, pela pertinência, ao controle sobre a atividade sindical.
A título de exemplo, já no governo de José Linhares, em 1946, pretendeu-se, pelo Decreto n. 8.740, de 19 de janeiro, alterar a regulamentação da organização sindical, que todos acusam estar aí até hoje como uma herança maldita da mente fascista de Vargas. Por intermédio do Decreto referido, conferiu-se nova redação aos artigos 511, 513, 514, 515, 517 e § 1º, 518 e §§ 1º e 2º, 520, 522, 525, letra a 526, 527 e letra a, 530, 531, §§ 3º e 532 e §§ 1º, 2º, 3º, 534, § 1º, 536, 537 e § 2º, 538, 540, 542, 543, 547, parágrafo único, 549, parágrafo único, 550 e § 2º, 551, 553, letra c, 554, 555, 556, 557, letras a e b e § 2º 565, 567, 570, 571, 572, 573, § 2º, 574, parágrafo único, 575, 580, letra c, 583, 584, 586 e §§ 5º e 6º, 588 e §§ 2º e 3º, 592, II, letra a e parágrafo único, 594, 596, 597 e parágrafo único, 606 e § 1º e 610, da CLT.
Pela nova redação foi estabelecida a liberdade sindical, ou seja, o permissivo de uma ação sindical sem interferência estatal. O novo texto do art. 511 passou a explicitar que era “livre a organização sindical em todo o território nacional”, enquanto que o anterior tratava da licitude da organização em conformidade com as condições legais estabelecidas.
O artigo 530, da CLT, em sua redação original, proibia que fossem eleitos para cargos administrativos ou de representação econômica ou profissional “a) os que professarem ideologias incompatíveis com as instituições ou os interesses da Nação; b) os que não tivessem aprovadas as suas contas de exercício em cargo de administração; c) os que houverem lesado o patrimônio de qualquer entidade sindical; d) os que não estiverem, desde dois anos antes, pelo menos, no exercício do efetivo da atividade ou da profissão dentro da base territorial do sindicato, ou no desempenho de representação econômica ou profissional; e) os que tiverem má conduta, devidamente comprovada”
A nova alteração trazida pelo Decreto 8.740, de 19 de janeiro de 1946, retirava essas restrições, prevendo apenas a proibição de eleição para “a) os que não tiverem aprovadas as suas contas de exercício em cargo de administração; b) os que houverem lesado o patrimônio de qualquer entidade sindical; c) os que não estiverem, desde dois anos antes, pelo menos, no exercício efetivo da atividade ou da profissão dentro da base territorial do sindicato, ou no desempenho de representação econômica ou profissional; d) os que tiverem má conduta, devidamente comprovada.”
Mas, a vigência de tal Decreto não durou muito. Com o advento do governo Dutra, o Decreto-Lei, publicado em 8.987-A, de 15 de fevereiro de 1946, revogou o Decreto 8.740/46 e revigorou os termos da CLT.
Assim, embora se possa dizer que a organização sindical brasileira, com natureza corporativa, tenha sido implementada por Vargas a partir de 1931 (e não a partir de 1943), a sua vigência de 1946 em diante está ligada aos interesses do governo militar e da elite da classe empresarial brasileira.
No período da ditadura civil-empresarial-militar de 1964 a 1985 se inicia com o seguinte pronunciamento:
“O Comando Supremo da Revolução (SIC), tendo tomado conhecimento de que indivíduos ligados ao peleguismo e que infestam os meios sindicais estão desenvolvendo campanhas e boatos para provocar inquietações nos meios operários, vem uma vez por todas esclarecer os seguintes pontos: 1 – A Revolução vitoriosa levada a cabo pelas Fôrças Armadas, com apoio do povo, considera irreversíveis as conquistas sociais legítimas contidas na legislação trabalhista em vigor; 2 – Os trabalhadores continuarão em pleno gozo de seus direitos, agora mais do que antes, porque estão livres da influência político-partidária; 3 – A Justiça do Trabalho permanece em pleno funcionamento em sua missão de defesa dos justos interesses e de harmonizar as divergências entre empregados e empregadores; 4 – O Comando Supremo da Revolução está certo de que os trabalhadores brasileiros saberão não dar ouvidos a estes boatos, desprezando os elementos perturbadores, saberão cumprir seus deveres e obrigações, inseparáveis que são dos direitos constantes da legislação trabalhista brasileira.”[19] – grifou-se.
Embora se tenha feito essa declaração, a CLT é praticamente reescrita no período. Para se ter uma ideia, considerando apenas os preceitos pertinentes aos direitos materiais (625 artigos), seguindo a linha da presente investigação, os militares, até final de 1968, alteraram, revogaram ou revitalizaram os textos de 235 artigos da CLT, sem falar nas incursões por meio de legislação específica.
De plano, em dezembro de 1964, por intermédio da Lei n. 4.589, extinguiram as Comissões de Salário Mínimo (arts. 101 a 111) de Imposto Sindical (arts. 595 a 597) e criaram o Departamento Nacional de Emprego e Salário, o Conselho Superior do Trabalho Marítimo e as Delegacias Regionais do Trabalho do Distrito Federal e do Estado da Guanabara, e transforma a Divisão de Higiene e Segurança do Trabalho, em Departamento Nacional de Segurança e Higiene do Trabalho.
No ano de 1966 modificações mais contundes são impostas à CLT – e à legislação trabalhista em geral – pelo governo militar. Destacam-se as alterações introduzidas, pelo Decreto-Lei n. 3 de 27/01/66, nos artigos 472, §§ 3º. a 5º.; 482, parágrafo único, e 582, in verbis:
Art. 472…
“§ 3º. Ocorrendo motivo relevante de interêsse para a segurança nacional, poderá a autoridade competente solicitar o afastamento do empregado do serviço ou do local de trabalho, sem que se configure a suspensão do contrato de trabalho.
§ 4º O afastamento a que se refere o parágrafo anterior será solicitado pela autoridade competente diretamente ao empregador, em representação fundamentada, com audiência da Procuradora Regional do Trabalho, que providenciará desde logo a instalação do competente inquérito administrativo.
§ 5º Durante os primeiros 90 (noventa) dias dêsse afastamento, o empregado continuará percebendo sua remuneração.”
Art. 482…
“Parágrafo único – Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado, a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional.
Art. 528. Ocorrendo dissídio ou circunstâncias que perturbem o funcionamento de entidade sindical ou motivos relevantes de segurança nacional, o Ministro do Trabalho e Previdência Social poderá nela intervir, por intermédio de Delegado ou de Junta Interventora, com atribuições para administrá-la e executar ou propor as medidas necessárias para normalizar-lhe o funcionamento.”
É possível perceber que esta alteração teve como objetivo a repressão ao movimento operário. Chama a atenção que ao introduzir a hipótese de afastamento do empregado por motivo de segurança nacional na CLT, o Decreto 3, em seu artigo 11, define o que seria atentatório à segurança nacional:
“Art. 11. Será considerado atentatório à segurança nacional, afora outros casos definidos em lei:
 a) Instigar, preparar, dirigir ou ajudar a paralisação de serviços públicos concedidos ou não ou de abastecimento;
 b) Instigar, públicamente ou não, desobediência coletiva ao cumprimento de lei de ordem pública.”
Notabilizam-se nesta atuação dos militares sobre a CLT, neste primeiro período, a revitalização, pelo Decreto-Lei n. 05, de 4/4/66, dos artigos 238 e 244, que haviam sido modificados no governo de Goulart; e a revogação, pelo Decreto-Lei n. 229, de 28/02/67, do art. 530, tal qual estava vigente desde a última alteração proposta por Vargas, em 1952, fixando-se, então, dentre outras, a proibição de que fossem eleitos para cargos administrativos ou de representação econômica ou profissional, “os que tiverem sido condenados por crime doloso enquanto persistirem os efeitos da pena”; “os que não estiverem no gôzo de seus direitos políticos” e “os que, pública e ostensivamente, por atos ou palavras, defendam os princípios ideológicos de partido político cujo registro tenha sido cassado, ou de associação ou entidade de qualquer natureza cujas atividades tenham sido consideradas contrárias ao interêsse nacional e cujo registro haja sido cancelado ou que tenha tido seu funcionamento suspenso por autoridade competente”.
No segundo período, na vigência do Ato Institucional n. 5, o AI 5, de 1969 a março de 1985, foram modificados 151 artigos da CLT, sendo que alguns já haviam sido alvo de alteração no primeiro período mencionado.
Em março de 1969, o Decreto-lei n. 507, incluiu no art. 530, o inciso VII, impossibilitando de serem eleitos para cargo diretivo de sindicato os que tivessem “má conduta, devidamente comprovada”.
A Lei n. 6.200, de 16 de abril, de 1975, alterou o artigo 514, mas de modo a reforçar a lógica de intervenção do Estado na atividade sindical e de lhe atribuir uma função puramente assistencial. Acresceu-se ao referido artigo, que tratava dos “deveres” do sindicato, a letra “d”, com o seguinte teor: “d) sempre que possível, e de acordo com as suas possibilidades, manter no seu quadro de pessoal, em convênio com entidades assistenciais ou por conta própria, um assistente social com as atribuições específicas de promover a cooperação operacional na empresa e a integração profissional na Classe.”
No ano de 1976, a Lei n. 6.386, de 09 de dezembro, alterou vários artigos da CLT (549 a 551; 566; 580 a 592; e 608), ampliando a lógica de intervenção do Estado sobre a atividade sindical, em especial no aspecto financeiro.
Perceptível, portanto, que os momentos de falência democrática implicaram em forte repressão da atividade sindical.
Por esse breve relato é possível perceber, também, que o percurso histórico da CLT é bastante intenso e explica, inclusive, as mudanças políticas experimentadas no país, sendo plenamente sem sentido fazer uma foto congelada da CLT em 1943 e querer a partir disso fazer uma consideração crítica a seu respeito.
IV- Redução de custos
É igualmente sem qualquer sentido falar em rigidez da legislação trabalhista ou mesmo em alto custo para a produção que essa legislação representa para efeito de reivindicar redução de direitos como forma de alavancar a economia.
Essa estratégia – econômica e humanamente equivocada – de flexibilização da legislação vem sendo adotada entre nós desde 1964, tendo sido, aliás, uma das principais motivações para o golpe.
No período da ditadura militar, apesar da Declaração apresentada pelo governo, conforme acima expresso, verificou-se um intenso ataque aos direitos trabalhistas, sendo que a própria CLT foi praticamente toda reescrita, chegando-se à promoção de alterações quase que diariamente, como se houvesse mesmo uma ideia fixa do governo sobre a matéria.
A perspectiva dos militares era “recuperar a credibilidade do país junto ao capital estrangeiro. Para isso, adotaram medidas como a contenção dos salários e dos direitos trabalhistas”[20].
O plano econômico, elaborado por Roberto Campos, consistia em: “corte severo nos gastos públicos; aumento de impostos; arrocho salarial; restrição do crédito às empresas; incentivo às exportações; abertura aos investimentos estrangeiros; retomada do crescimento econômico”[21], buscando conter a inflação e obter o aval do FMI, para conseguir empréstimos estrangeiros, especialmente dos EUA.
Esta política econômica, aliada ao aumento das tarifas públicas, resultou e sempre resultará em recessão, que “foi suportada por uma população proibida de protestar”[22]. Além disso, empresas americanas passaram a investir no Brasil. A concorrência dessas empresas e a recessão (que reduziu o mercado interno) causaram a falência de muitas empresas nacionais, com aumento do desemprego.
Do ponto de vista das alterações promovidas fora do âmbito da CLT, destaca-se a Lei n. 4.749, de 13 de agosto de 1965, que atendeu o reclamo de redução de direitos trabalhistas, fixando um parcelamento para o pagamento do 13º. salário, que fora criado em 1962, durante o governo de João Goulart. O Decreto n. 57.155, de 03 de novembro do mesmo ano, estabeleceu a fórmula válida até hoje: 1a. metade entre fevereiro e novembro e a 2a. metade até o dia 20 de dezembro.
Em 23 de dezembro de 1965, foi publicada a Lei n. 4.923, pela qual, a pretexto de estabelecer medidas contra o desemprego, trouxe novas fórmulas para redução de direitos trabalhistas, atingindo, diretamente, os salários, possibilitando a sua redução mesmo sem autorização dos trabalhadores ou de seus sindicatos.
É interessante perceber que mesmo dentro desse contexto político autoritário, cujo objetivo era reduzir direitos trabalhistas, alguns limites foram preservados, os quais, hoje, dentro de uma lógica democrática ainda assombrada pela onda neoliberal, não se quer reconhecer, tentando-se fazer acreditar que a redução de salário possa ser fixada por ajuste coletivo de trabalho, sem qualquer condicionamento jurídico.
Fato é que a Lei n. 4.923/65 fixou condições e limites para a redução do salário: redução máxima de 25%, respeitado o valor do salário mínimo; necessidade econômica devidamente comprovada; período determinado; diminuição correspondente da jornada de trabalho ou dos dias trabalhados; redução, na mesma proporção, dos ganhos de gerentes e diretores; autorização por assembléia geral da qual participem também os empregados não sindicalizados.
Além disso, a mesma lei criou as bases do seguro-desemprego e, trouxe a regra de que:
“Art. 11 – A empresa que mantiver empregado não registrado, nos termos do art. 41 e seu parágrafo único da Consolidação das Leis do Trabalho, incorrerá na multa de valor igual a um salário-mínimo regional, por trabalhador não registrado, acrescido de igual valor em cada reincidência.”
A Lei n. 4.654, de 02/06/1965, alterou os artigos 180 e 223 da CLT, dando já a indicação de qual seria a maior preocupação dos militares em matéria trabalhista: a segurança e a saúde no trabalho[23].
Em 1966, o Decreto-Lei n. 5, de 04/04/66, revoga a Lei n. 3.970/61, para o fim de restaurar os artigos 238 e 244 da CLT, em sua redação primitiva, de modo a atender os interesses das empresas ferroviárias.
No mesmo ano de 1966, a Lei n. 5.161, de 21 de outubro, autoriza a instituição da Fundação Centro Nacional de Segurança, Higiene e Medicina do Trabalho, com o objetivo principal e genérico da realização de estudos e pesquisas pertinentes aos problemas de segurança, higiene e medicina do trabalho (art. 1º.). Estabelece o art. 2º., da referida lei, que “poderão participar, também da instituição, manutenção e das atividades da Fundação, entidades e organismos públicos e privados, nacionais, estrangeiros e internacionais”.
Criou-se, assim, em 1966, a Fundacentro, órgão responsável pela elaboração de estudos sobre o ambiente de trabalho, tendo como preocupação básica a diminuição dos altos índices de acidentes e doenças do trabalho. Vale esclarecer que desde 1960 o Governo brasileiro iniciou gestões com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) para tal finalidade.
O Decreto-Lei n. 229/66 é quase uma nova CLT, vez que modifica, revogando ou alterando de alguma forma, 200 artigos da CLT. O DL 229 altera os arts. 13; 14; 15; 18; 20; 21; 22; 24; 26 27; 28; 29; 31; 32; 33; 36; 37; 39; 40; 42; 43; 44; 47; 49; 51; 52; 53; 54; 55; 56; 70; acresce o parágrafo único ao art. 78; altera os arts. 80; 140; modifica o nome do Capítulo V; altera os arts. 154; 155; 156; 157; 158; 159; 160; 161; 162; 163; 164; 165; 166; 167; 168; 169; 170; 171; 172; 173; 174; 175; 176; 177; 178; 179; 180; 181; 182; 183; 184; 185; 186; 187; 188; 189; 190; 191; 192; 193; 194; 195; 196; 197; 198; 199; 200; 201; 202; 203; 204; 205; 206; 207; 208; 209; 210; 211; 212; 213; 214; 215; 216; 217; 218; 219; 220; 221; 222; 223; 224; 362; 374; 379; 389; 392; 393; 397; 402; 403; 405; 406; 407; 408; 413; 417; 418; 420; 421; 434; 435; 436; 441; acresce o § 2º. ao art. 443; altera o art. 445; acresce o § 3º. ao art. 457; altera o art. 458; acresce os §§ 2º a 4º art. 462; altera o art. 473; o § 4º. do art. 478; o art. 510; acresce o parágrafo único ao art. 529; altera o art. 530; acresce o parágrafo 5º. ao art. 532; altera os arts. 543; 544; 553; 576; 579; 592; 611; 612; 613; 614; 615; 616; 617; 618; 619; 620; 621; 622; 623; 624; 625; 628; 629; 630; 635; 636; 637; 640; 654; 656; 661; 662; 702; 709; 789; 790; 836; 894; 896; 899; revoga os arts. 45, 46, 121, 127, 128, 398, 536, 567; 568; 569, e os §§ 2º. dos arts. 573 e 904, passando os §§ 1º para parágrafo único.
No Decreto-Lei n. 229 foi praticamente reescrito todo o Capítulo de Segurança e Higiene do Trabalho (artigos 154 a 223), criando seções e melhor organizando os dispositivos.
Muito se discute acerca dos propósitos da atuação dos militares nesta seara, sendo que para alguns[24] a intenção foi adotar parâmetros internacionais de relações de trabalho e difundir o discurso oficial, particularmente por meio da Fundacentro, no que se refere à prevenção dos acidentes do trabalho, que ocorriam em grande número. Esse discurso teria tido a intenção de formatar os trabalhadores, técnica e ideologicamente, para o novo capitalismo industrial que o regime autoritário queria implantar no país, sendo que isso se daria por meio da atribuição da responsabilidade pelos acidentes aos próprios acidentados, difundindo-se a teoria do ato inseguro da vítima, o que retirava dos empregadores a obrigação quanto à reparação dos danos. Em complemento, afirmava-se que o meio de prevenir tais acidentes seria a educação, o treinamento e a formação da mão de obra, o que na prática não dava nenhum resultado na prevenção, mas aumentava o poder de controle do empregador sobre os trabalhadores, afastando-os ainda mais do domínio sobre o processo de produção.
Sobre o acidente do trabalho especificamente, cuja menção serve para demonstrar a verdadeira posição da ditadura militar perante a questão trabalhista, auxiliando na própria compreensão do Decreto n. 229, adverte Laurita Andrade Sant’anna dos Santos:
“A Lei estabelece a transferência do seguro-acidente de trabalho para a Previdência Social. Cohn et Alli (1985) chamam a atenção para o fato que, a partir da Lei n. 5.316/67, a palavra “indenização” é substituída pela categoria “prestação”, sendo que o empregador fica isento de responsabilidade quanto ao acidente de trabalho, cabendo ao acidentado o ônus pela lesão física e, ao Estado, o dever de ampará-lo temporária ou definitivamente. Esse enfoque se mantém na legislação que se segue, Decretos-lei n. 898 de 1969 e n. 73.037 de 1976. Segundo Lacaz e Ribeiro (1984) esses Decretos desencadeiam um franco retrocesso na legislação acidentária.”[25]
Em 1977, a Lei n. 6.514, de 22 de dezembro, novamente altera todo o Capítulo da Segurança e Higiene do Trabalho (arts. 154 a 201), que passa a ser denominado Segurança e Medicina do Trabalho e recebe nova organização (que está em vigor até hoje), com revogação expressa dos artigos 202 a 223.
Como se vê, até 1985, a CLT foi reescrita por diversas mãos e, sobretudo, pelas mãos do governo militar, que se constituiu, historicamente, como uma oposição política ao getulismo e, sobretudo, ao diálogo social proposto por João Goulart.
Mas as alterações na CLT não se encerram em março de 1985. De lá para cá foram feitas alterações em 136 artigos da CLT.
Mesmo a Constituição de 1988, que representou uma espécie de corte na linha regressiva de direitos trabalhistas e que só se concretizou por causa da força política da classe trabalhadora naquele momento de uma espécie de unidade nacional para a redemocratização, não foi capaz, concretamente de reverter a situação.
Passada a euforia democrática, os ataques aos direitos trabalhistas retornam, embalados pelo neoliberalismo. Logo pós a promulgação da Constituição teve início um processo de destruição da Constituição de 1988 pela via da interpretação. A Constituição passou por um processo de “depuração” neoliberal, pelo qual se tentou extirpar o conteúdo social da Constituição, notadamente no que se refere à eficácia e o alcance dos direitos trabalhistas.
Tendo como Ministro da Fazenda o sociológico Fernando Henrique Cardoso, o governo Itamar já incorpora a racionalidade neoliberal, buscando a “flexibilização” da legislação trabalhista, cobrada pelos industriais, por intermédio da FIESP e da CNI, desde 1989.
Nesse período, destaca-se a Lei n. 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, que revogou os artigos 254 a 292 (Dos Serviços de Estiva) e inciso VII do art. 544 da CLT, referentes ao regime jurídico de exploração dos portos.
O Judiciário e a doutrina também atuaram fortemente na negação do direito de greve e também para autorizar a utilização, em larga escala, da técnica de terceirização, que divide a classe trabalhadora e dificulta sua resistência.
Emblemático neste sentido o advento, em 1993, do Enunciado 331 do TST (hoje Súmula 331), que, rompendo a tradição jurídica trabalhista, passa a autorizar a terceirização na atividade-meio.
A Lei 8.966, de 27 de dezembro de 1994, alterou a redação do art. 62 da CLT, ampliando a compreensão dos empregados que estariam fora da limitação da jornada de trabalho, contrariando, inclusive, os termos expressos da Constituição Federal de 1988.
A propósito, é interessante perceber que o artigo originário da CLT excluída da aplicação do Capítulo respectivo, “os vendedores pracistas, os viajantes e os que exercerem, em geral, funções de serviço externo não subordinado a horário, devendo tal condição ser, explicitamente, referida na carteira profissional e no livro de registro de empregados, ficando-lhes de qualquer modo assegurado o repouso semanal; b) os vigias, cujo horário, entretanto, não deverá exceder de dez horas, e que não estarão obrigados à prestação de outros serviços, ficando-lhes, ainda, assegurado o descanso semanal;  b) os gerentes, assim considerados os que investidos de mandato, em forma legal, exerçam encargos de gestão, e, peIo padrão mais elevado de vencimentos, só diferenciem aos demais empregados, ficando-lhes, entretanto, assegurado o descanso semanal; c) os que trabalham nos serviços de estiva e nos de capatazia nos portos sujeitos a regime especial”, enquanto que o mesmo artigo, segundo a redação que lhe fora dada pela Lei n. 8.966, de 27/12/94, excluiu da limitação da jornada “I – os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados; e  II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.”
O governo Fernando Henrique Cardoso toma para si a tarefa, segundo faz difundir, de pôr fim ao “entulho autoritário”, legado de Vargas, promovendo, sobretudo, um ataque frontal à legislação trabalhista mediante a utilização de Medidas Provisórias.
Em 30 de junho de 1995, a Medida Provisória n. 1.053, de 30 de junho de 1995 (Plano Real), prevê a proibição de reajustes salariais com base em índice inflacionário; proibição a negociação coletiva, como forma de reajustar salários com base em índices de preços.
Destaque-se a criação, em 1995, do MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, que desenvolve a ideia de subsidiariedade do Estado e impulsiona o recurso à terceirização no serviço público.
A terceirização no setor público, aliás, já tinha sido prevista na Lei n. 8.031/90 e, mais tarde, foi reforçada pela Lei n. 9.491/97.
Lembre-se, também, da Lei n. 8.949, de 9/12/94, que desvirtuou o instituto da cooperativa para o fim de permitir a criação de cooperativas de trabalho, que, na prática, funcionaram para inserir trabalhadores no modo de produção capitalista sem o retorno mínimo dos direitos constitucionalmente assegurados aos trabalhadores.
Em 23 de dezembro de 1996, o Poder Executivo, mediante o Decreto n. 2.100, acatando a interpretação que se tornou predominante à época no sentido da inaplicabilidade da Convenção no ordenamento nacional, tornou pública a denúncia da Convenção, realizada pelo Governo, em carta enviada à OIT, em 20 de novembro de 1996, explicitando que a Convenção 158 deixaria de ter vigência em nosso ordenamento, a partir de 20 de novembro de 1997.
A Lei n. 9.504/97, que afastou o vínculo de emprego na prestação de serviços em campanhas eleitorais; a Lei n. 9.601/1998, que criou o “contrato provisório”, pelo qual passou a ser possível a formação de um vínculo por prazo determinado sem vinculação a qualquer motivo específico, a não ser o fato de estar previsto em um instrumento coletivo desde que destinado ao aumento do número de empregados da empresa, com a contrapartida econômica da redução do FGTS de 8 para 2%; a Lei n. 9.601/1998, que regulou o “banco de horas”, permitindo, em síntese, o trabalho em horas extras sem o pagamento correspondente, mediante compensação de horas dentro do período de cento e vinte dias, que logo depois passou a ser de 12 (doze) meses; a Lei n. 9.608/98, que rechaçou o vínculo de emprego para o trabalho voluntário, entendido como tal “a atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza, ou a instituição privada de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social, inclusive mutualidade”; a Medida Provisória n. 1.952-18, de 9 de dezembro de 1999, que instituiu o contrato a tempo parcial, até vinte e cinco horas semanais, com salário por hora proporcional à jornada; a Lei n. 10.101/00, que regulou a participação nos lucros e nos resultado, recusando a natureza salarial do montante pago e previu a formação de mediação e arbitragem de ofertas finais, para a solução dos conflitos decorrentes; a Lei n. 10.243/01, que, alterando o art. 458, da CLT, afastou a natureza salarial de diversas parcelas recebidos pelo trabalho em contraprestação pelo trabalho prestado.
Chega-se ao governo Lula, ainda com o efeito da intensa discussão em torno da alteração do artigo 618, da CLT, pela qual se tentou implementar a lógica da prevalência do negociado sobre o legislado, passando pela Emenda 3, que buscava impedir a ação da Inspeção do Trabalho, no sentido da efetivação da legislação do trabalho.
O primeiro ato político do governo Lula foi o de retirar o projeto de lei que alterava o art. 618, da CLT, do Congresso. Imagina-se, então, que alterações legislativas de majoração dos direitos trabalhistas pudessem vir, mas não foi bem assim.
O segundo ato do governo foi o de criar um Conselho para pôr em discussão a legislação social, expondo-a às críticas abertas daqueles que historicamente lhe foram resistentes.
Na correlação de forças políticas, diante de uma pressão econômica internacional, perante um país endividado, e diante da lógica fatalística da globalização, sem uma oposição ideológica em nível mundial, claro, o resultado dessa discussão não poderia ser, como não foi, favorável aos trabalhadores.
Chegou-se mesmo a acolher no seio do Ministério do Trabalho um ataque ideológico à CLT, difundindo-se abertamente que a CLT precisava passar por uma “faxina”, como se os direitos dos trabalhadores fossem lixo.
Em 2003, por iniciativa do governo, foi aprovada a lei do “primeiro emprego”, n. 10.748, que incentivava a contratação de jovens, com subvenção do Poder Executivo, mas condicionada à comprovação de situação regular perante o FGTS, INSS, Receita Federal e dívida ativa da União.
Ainda em 2003, após regulação por Medida Provisória, entra em vigor a Lei n. 10.820, que passou a permitir desconto no salário para obtenção de financiamento bancário.
Em 2005, a lei de recuperação judicial, Lei n. 11.101, retirou do crédito trabalhista (superior a 250 salários mínimos) o caráter privilegiado com relação a outros créditos e tentou eliminar a figura da sucessão trabalhista.
A Lei Complementar n. 123, de 14 de dezembro de 2006, entre outras disposições, acrescentou o § 3º ao artigo 58 da CLT, a fim de permitir às microempresas e empresas de pequeno porte, por meio de negociação coletiva, estipular o tempo médio gasto pelo empregado, quando o local de trabalho for de difícil acesso ou não servido por transporte público e o empregador fornecer a condução.
Em 2012, já no governo Dilma iniciado em 1º de janeiro de 2001, a Lei n. 12.690, de 19 de julho, tentou reforçar “o funcionamento das Cooperativas de Trabalho”, instituindo “o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho – PRONACOOP” e revogando “o parágrafo único do art. 442 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943”.
A partir de 2014 advém nova onda de retração de direitos trabalhistas. Vide, neste sentido: o Decreto n. 8.243/14, que instituiu a Política Nacional de Participação Social (PNPS), ao qual se acoplou projeto de lei que visa a criação de um Sistema Único do Trabalho (SUT), que, de forma sutil, retoma a ideia embutida na Emenda 3, de negar o caráter de indisponibilidade da legislação trabalhista; as MPs 664 e 665 (revertidas nas Leis ns. 13.134/15 e 13.135/15), que ampliaram as exigências para aquisição dos benefícios da pensão por morte e seguro-desemprego; a Lei n. 13.103/15, que retrocedeu com relação aos avanços, mesmo tímidos, que haviam sido conferidos aos motoristas pela Lei n. 12.619/12; a Lei Complementar n. 150/15, que, regulando o trabalho doméstico, sorrateiramente, contrariou a Emenda Constitucional n. 72, negando a igualdade de direitos prevista na EC; a Lei n. 13.189/15 (que reproduziu a MP 680/15, pertinente a uma tal Proteção ao Emprego, que se daria, concretamente, por intermédio da redução temporária, em até trinta por cento, da jornada de trabalho dos empregados, com a redução proporcional do salário (art. 3º.); a Medida Provisória 681/15, que, seguindo a linha de proteção do mercado já traçada pela Lei n. 10.820/03, ampliou as possibilidades de autorização do empregado (e também segurados do INSS e servidores públicos federais) para desconto direto em seu salário (em até 30%), fazendo menção expressa, desta feita, às dívidas de cartão de crédito (no limite de 5%), além de passar a permitir que o desconto também se dê nas verbas rescisórias, o que, antes, estava vedado.
Vale perceber que em paralelo, em junho de 2011, o PL 4.330, de autoria do Deputado Federal e empresário, Sandro Mabel, que visa ampliar, sem qualquer limite, a terceirização, e que estava paralisado no Congresso desde 2004, quando foi apresentado, voltou a tramitar, impulsionado pelo substitutivo do Deputado Roberto Santiago (PV-SP).
Em meados de 2012, um anteprojeto de lei gestado no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, filiado à CUT, propondo a institucionalização de um Acordo Coletivo Especial (ACE), foi enviado ao governo para que fosse apresentado pelo Executivo ao Congresso Nacional. O projeto, em certo sentido, revigorava a tentativa do governo de Fernando Henrique Cardoso de implementar o negociado sobre o legislado, favorecendo, no jogo livre das forças, em uma conjunta de desemprego estrutural, aos interesses empresariais.
Coincidência, ou não, no mesmo ano de 2012, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) apresentou um paper com o título, “101 Propostas para Modernização Trabalhista”, tendo por objetivo explícito defender a redução dos “altos custos” do emprego formal, vistos como um dos mais graves entraves ao aumento da competitividade das empresas brasileiras. Em certo sentido, esse documento retratou o avanço doutrinário e jurisprudencial vivenciado pelo Direito do Trabalho desde 2002, pois que a par de continuar fazendo críticas à “vetusta CLT”, pôs-se no ataque às posições assumidas pelo Tribunal Superior do Trabalho nos últimos anos, acusando-as de “irracionais”.
V- Conclusão
Fácil verificar, portanto, que a CLT não é antiquada e que tudo já se fez, desde 1964, para tentar salvar a economia por intermédio dessa estratégia – extremamente equivocada – da flexibilização, que se trata, em verdade, de uma redução de direitos trabalhistas, que, no estágio atual, conforme se pretende implementar, representa uma completa eliminação da proteção jurídica legal.
O que se deseja com essas medidas da ampliação irrestrita da terceirização e da prevalência do negociado sobre o legislado é, simplesmente, levar às últimas conseqüências o propósito de exploração sem limites da força de trabalho.
Vale perceber que se o maior efeito da terceirização ampliada, sem limites, é a pulverização da classe trabalhadora, impedindo sua organização sindical, a adoção, em conjunto, do negociado sobre o legislado permite que, numa negociação na qual os trabalhadores já perderam a sua força, o resultado seja a completa eliminação de direitos, ainda mais sob a ameaça do desemprego. Se não há lei que imponha limites a essa negociação desigual, a tendência é que, no livre jogo da concorrência, se chegue a um resultado extremamente desfavorável aos trabalhadores, á sociedade como um todo, em razão dos custos sociais gerais pelos acidentes e doenças no trabalho, e à própria economia, vez que se trata de uma lógica que favorece unicamente às grandes empresas (em detrimento das pequenas empresas), pois são estas que possuem maior possibilidade de se valerem, com maior intensidade, desses mecanismos de “flexibilização”.
Assim, o que o governo temporário pretende é fazer aquilo que nem mesmo a ditadura militar foi capaz de realizar, qual seja, eliminar por completo toda a proteção jurídica trabalhista.
Mas isso, ao contrário do que anteveem os “economistas” neoliberais, não reforça a lógica do sistema capitalista, pois se assim fosse, dadas as diversas experiências já realizadas neste sentido, como sobejamente demonstrado acima, o Brasil seria uma grande potência econômica mundial, ainda mais porque a parca legislação existente sequer tem sido efetivamente respeitada, diante, inclusive, do sucateamento a que foi submetida, desde 1964, a estrutura de fiscalização do trabalho brasileira.
E ainda que a redução de custos, por meio da retração de direitos, fosse benéfica a alguns empregadores, é evidente que no cômputo geral todos os demais empregadores, ou ao menos uma boa parte, a que depende do mercado interno, seriam prejudicados, pois o ganho de capital só se perfaz com o consumo e se todos os trabalhadores recebem menos e precisam poupar o pouco que ganham, em razão da falta de um eficaz sistema de segurança social, o consumo se reduz ao ponto trágico de provocar nova reivindicação de redução de custos – e é esse o processo no qual já nos inserimos nos últimos 50 anos.
A redução de direitos, além disso, mata a “galinha dos ovos de ouro” do capitalismo que é a força de trabalho, que é o capital vivo. O que produz capital é o trabalho e o trabalho advém do ser humano, o qual, para trabalhar, precisa sobreviver. Além disso, o trabalhador, como cidadão, tem o direito a uma vida digna, segundo prometem a Constituição Federal brasileira e todos os documentos internacionais referentes aos Direitos Humanos, sendo que as garantias trabalhistas a um salário justo, à limitação da jornada de trabalho, a condições dignas de trabalho, à limitação da idade para o trabalho, à proteção contra o desemprego, ao seguro contra as contingências sociais, à sindicalização e ao exercício do direito de greve estão, expressamente, asseguradas em tais instrumentos normativos.
A retomada dos argumentos em prol da flexibilização e da redução de custos da produção por meio da retirada de direitos trabalhistas representa, em si, um grave retrocesso, que não resiste, no entanto, às evidências extraídas da análise do percurso da experiência histórica trabalhista. Essa reivindicação, aliás, dificulta a visualização daquilo que seria realmente essencial, qual seja, a utilização de nossa capacidade intelectiva para romper concretamente os obstáculos que impedem a superação das dificuldades para a construção de uma sociedade efetivamente justa; e não a da utilização da inteligência para encontrar argumentos que tentam legitimar a exploração ilimitada do trabalho a partir do estado de necessidade de quem é explorado e dos limites inexoráveis, quase “sagrados”, do processo produtivo.
Essa tarefa de tentar eliminar por completo o Direito do Trabalho, que passa pela tentativa de extinguir a Justiça do Trabalho, é, no entanto, muito mais árdua do que se possa parecer, seja pela natural resistência que os trabalhadores organizados, superando as divergências políticas, tendem a realizar, seja pelas limitações impostas pelos princípios e regras constitucionais que garantem à classe trabalhadora um rol de direitos no nível dos direitos fundamentais, que não podem ser suplantados por lei infraconstitucional ou mesmo por mera reforma constitucional.
O pacto constitucional firmado em 1988 foi o de que o desenvolvimento econômico está atrelado aos ditames da justiça social e aos princípios da dignidade humana e do valor social do trabalho, reproduzindo, inclusive, todo o compromisso mundial estabelecido para a reconstrução da humanidade no pós-guerra e do qual adveio, inclusive, o postulado básico do não-retrocesso no que tange aos direitos fundamentais, sobretudo de natureza social.
Assim, ainda que se pretenda pela via legislativa, por atuação congressual, impor aos trabalhadores o sacrifício do pagamento da dívida de uma suposta crise econômica, para a qual não contribuíram, haverá sempre o obstáculo estabelecido pela atuação de uma gama cada vez maior, mais consciente e comprometida de profissionais ligados às questões do trabalho e que certamente insistirão no cumprimento de sua obrigação de buscar a melhoria da condição humana[26] e de garantir a eficácia da Constituição Federal e dos preceitos internacionais dos Direitos Humanos[27], ainda mais tendo o conhecimento de que todas as experiências de flexibilização já foram tentadas e não deram certo.
Aliás, reconhecendo-se o extremo sofrimento a que vem sendo submetida a classe trabalhadora nas últimas décadas, haja vista a reiterada supressão de direitos e o elevado número de acidentes no trabalho sofridos, é chegado o momento de romper essa escalada regressiva e começar a dar os passos necessários para, enfim, aplicar a Constituição Federal, gerando: a) a implementação das condições materiais necessárias para uma atuação efetiva da fiscalização do trabalho, com punição das práticas reiteradas de descumprimento da legislação do trabalho; b) a eliminação das horas extras ordinariamente prestadas, que constituem um enorme desajuste da organização do processo produtivo e um grave dano aos trabalhadores e a sociedade em geral, e mais ainda quando se realizam sem a contraprestação mínima devia; c) a extinção do banco de horas, do trabalho infantil, do trabalho em condições análogas a de escravo e das estratégias de gestão que provocam assédio moral; d) o banimento de toda forma de terceirização, inclusive da considerada “atividade-meio”, sobretudo, no setor público; e) o respeito concreto ao direito constitucional de greve e à liberdade de sindicalização e atuação sindical; f) a proibição de dispensas arbitrárias de trabalhadores, socialmente irresponsáveis etc.
O fato desse debate em torno dos direitos trabalhistas, que sempre foi mais difundido no meio jurídico, ter sido dominado pelo grande público por conta do momento político vivido, quando a pauta trabalhista acabou tendo que ser explicitamente difundida, fornece fortes elementos de convicção para que se considere plenamente viáveis tanto a resistência à derrocada de direitos sociais e trabalhistas quanto a adoção de uma atuação efetivamente voltada à a ampliação desses direitos.
Nessa verdadeira disputa é importante não se deixar levar pelo fatalismo comovente do número de desempregados, pois se há efetivamente uma crise não foram os direitos dos trabalhadores os motivadores dela – até por conta do baixo nível salarial brasileiro, comparado com os países industrializados. Ademais, o elevado número de desempregados está diretamente relacionado com a crise política e com a aposta feita por alguns setores da indústria em torno da aprovação da lei terceirização, no contexto de uma estratégia que lhes permitiria, ao reporem a “força de trabalho” por meio da terceirização, tentar “legitimá-la” com o argumento de que a terceirização seria promotora do emprego…
Fato é que a crise econômica não pode ser utilizada como justificativa para negar vigência à Constituição Federal, notadamente no que se refere à essencialidade dos direitos sociais e trabalhistas, também porque isso daria ensejo a uma grave crise institucional, que, no momento presente, traz sério risco à democracia.
A defesa e a busca da eficácia dos direitos sociais representam, portanto, a pauta fundamental para a própria garantia da preservação do Estado Democrático de Direito Social.
São Paulo, 22 de maio de 2016.